segunda-feira, junho 05, 2006

Politicamente correcto? Não, hipocritamente incorrecto!

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Desde que os americanos se lembraram de começar a chamar "afro-americanos" aos pretos, com vista a acabar com as raças por via gramatical, isto tem sido um fartote pegado! As criadas dos anos 70 passaram a "empregadas" e preparam-se agora para receber menção de "auxiliares de apoio doméstico". De igual modo, extinguiram-se nas escolas os contínuos; passaram todos a "auxiliares de acção educativa". Os vendedores de medicamentos, inchados de prosápia, tratam-se de "delegados de informação médica". E pelo mesmo processo transmudaram-se os caixeiros-viajantes em "técnicos de vendas". Os drogados transformaram-se em “toxicodependentes"; o aborto eufemizou-se em "interrupção voluntária da gravidez"; os gangs étnicos são "grupos de jovens"; os operários fizeram-se de repente "colaboradores"; e as fábricas, essas, vistas de dentro são "unidades produtivas" e vistas da estranja são "centros de decisão nacionais". O analfabetismo desapareceu da crosta portuguesa, cedendo o passo à "iliteracia" galopante. Desapareceram outros... sim, dos comboios: as classes 1.ª e 2.ª, para não ferir a susceptibilidade social das massas hierarquizadas. Mas por imperscrutáveis necessidades de tesouraria continuam a cobrar-se preços distintos nas classes "Conforto" e "Turística".

A Ágata, rainha do pimba, cantava chorosa: «Sou mãe solteira...»; agora, se quiser acompanhar os novos tempos, deve alterar a letra da pungente melodia: «Tenho uma família monoparental...» - eis o novo verso da cançoneta, se quiser fazer jus à modernidade. Aquietadas pela televisão, já se não vêem por aí aos pinotes crianças irrequietas e «terroristas»; diz-se modernamente que têm um "comportamento disfuncional hiperactivo". Do mesmo modo, e para felicidade dos "encarregados de educação", os brilhantes programas escolares extinguiram os alunos cábulas; tais estudantes serão, quando muito, "crianças de desenvolvimento instável". Ainda há cegos, infelizmente. Mas como a palavra fosse considerada desagradável e até aviltante, quem não vê é considerado "invisual" (o termo é gramaticalmente impróprio, como impróprio seria chamar “inauditivos” aos surdos - mas o “politicamente correcto" marimba-se para as regras gramaticais). Para compor o ramalhete e se darem ares, as gentes cultas da praça desbocam-se em "implementações", "posturas pró-activas", "políticas fracturantes" e outros barbarismos da linguagem.

E assim linguajamos o Português, vagueando perdidos entre a «correcção política» e o novo-riquismo linguístico. À margem da revolução semântica ficaram as putas. As desgraçadas são ainda agora quem melhor cultiva a língua. Da porta do quarto para dentro, não há "politicamente correcto" que lhes dobre o modo de expressão ou lhes imponha a terminologia nova. Os amantes do idioma pátrio, se o quiserem ouvir pleno de vernaculidade, que se dirijam ao bordel mais próximo. Aí sim, um pénis de 25 centímetros é um caralho enorme e nunca um "órgão sexual masculino sobredimensionado"; assim como dos impotentes, coitados, dizem elas castiçamente que não levantam o pau, e não que sofrem de "disfunção eréctil".

2 Response to Politicamente correcto? Não, hipocritamente incorrecto!

Anónimo
05 junho, 2006 12:28

BRAVO!
sarapoto.

07 junho, 2006 08:58

Dantes também havia os «teimosos»... agora são eufemisticamente chamados de «presidentes de câmara»... vá se lá entender esta gente.... lolololol